Bancar o pequeno não ajuda o mundo

Recentemente tive o privilégio de ir à uma palestra extremamente incrível. Na verdade, esse texto foi escrito exatamente no mesmo dia, porém por questões ~técnicas~ (como o fato de o blog ainda não estar no ar), salvei e esperei para postar.

O palestrante se chamava Eduardo Lyra e, para quem não o conhece, eu recomendaria o Google - porém prefiro não correr o risco de alguém não se dar o trabalho de procurar e, assim, resumirei em poucas palavras: um jovem, atualmente com 28 anos, que veio diretamente da favela - barraco de madeira mesmo, chão de barro - com o pai preso por envolvimento em quadrilha e assalto. Parafraseando o próprio Eduardo, tudo para dar errado: a sociedade faz as contas; negro + pobre + filho de presidiário = bandido.

Eduardo Lyra; imagem da internet.

Mas não. Eduardo se formou em jornalismo, escreveu um livro chamado "Jovens Falcões" - o qual ainda não li, mas pretendo -, fundou um projeto chamado "Gerando Falcões" (http://gerandofalcoes.com/) - no qual atua com jovens, buscando mostrar que há um outro caminho fora aquele que a favela - e a sociedade, no caso - costuma oferecer. Como Eduardo diz: "não importa de onde você veio, o que importa é para onde você vai" (não excluindo todas as barreiras e dificuldades existentes para mulheres, que são diferentes das barreiras existentes para negros, que são diferentes das barreiras existentes para pobres, etc).

Eu não sabia muito bem qual seria o primeiro texto que eu postaria nesse blog que já estava em construção, mas assim que saí do Instituto 3M (local da palestra) não tive dúvidas e martelei as palavras na minha cabeça durante todo o dia. E vou explicar os meus porquês.

Eu sonho em mudar o mundo. De primeira, assim, pode parecer um tanto quanto ousado demais. Mas eu literalmente acordo e durmo todos os dias pensando "o que eu posso fazer com a minha vida de forma a fazer alguma diferença nesse mundo?". Costumo dizer que um dos meus maiores pavores é acordar em sei lá, 20 anos, e me ver infeliz com a carreira que construí e/ou estar acomodada em um emprego simplesmente pela vantagem financeira que ele me oferece. O que quer que eu venha a fazer um dia, seja qual for o caminho que eu trilhe, eu só espero chegar a algum lugar do qual eu me orgulhe, no qual eu faça alguma diferença - e no qual eu inspire outras pessoas a serem melhores do que, naquele momento, são.

E esse é outro dos meus porquês. Eu acredito que poucas coisas são mais bonitas do que a capacidade de inspirar o outro. E, assim como a vontade de mudar o mundo, a vontade de inspirar as outras pessoas também pode soar um tanto quanto pretensiosa e pode atrair alguns olhares que imediatamente implicam um tom de deboche, de "quem você pensa que é?". E é aqui que eu gostaria de citar Mandela*, que foi citado por Eduardo em sua palestra (que me fez ficar arrepiada da cabeça aos pés em torno de 10 vezes em mais ou menos uma hora de duração).

"O grande medo não é o de que sejamos incapazes.Nosso maior medo é que sejamos poderosos além da medida. É nossa luz, não nossa escuridão, que mais nos amedronta.Nos perguntamos: 'Quem sou eu para ser brilhante, atraente, talentoso e incrível?' Na verdade, quem é você para não ser tudo isso? Bancar o pequeno não ajuda o mundo. Não há nada de brilhante em encolher-se para que as outras pessoas não se sintam inseguras em torno de você.E à medida que deixamos nossa própria luz brilhar, inconscientemente damos às outras pessoas permissão para fazer o mesmo."

Se eu precisasse resumir a palestra em poucas palavras, provavelmente utilizaria um trecho dessa citação: "bancar o pequeno não ajuda o mundo. (...) e à medida que deixamos nossa própria luz brilhar, inconscientemente damos às outras pessoas permissão para fazer o mesmo."

Em um certo momento, Eduardo se referiu ao que ele chamou de "senso de responsabilidade" e "senso de urgência". Existem muitas coisas que não podem esperar: o menino que passa fome, a mulher que apanha, o cara que acabou de sair da prisão - e já tem um traficante batendo na porta, convidando para voltar. Essas são questões urgentes. E quando nós notamos a responsabilidade que temos pelo nosso mundo, pelas pessoas ao nosso redor, pelos problemas sociais, por tudo aquilo que reclamamos e delegamos a responsabilidade ao outro, quando isso acontece, nós começamos a nos mexer. Nós buscamos fazer alguma coisa.

Ele questionou: "quem aqui já pensou em mudar o mundo?". Eu já, respondi em pensamento. Todos os dias. E naquele momento, eu estava pensando mais do que nunca.

A palestra reforçou minhas crenças, reforçou meus sonhos, meus desejos. Reforçou meu senso de responsabilidade, me inspirou de uma forma que, quando saí por aquela porta, eu literalmente queria resolver todos os problemas do planeta. E melhor do que isso: reforçou os sonhos e os desejos de várias crianças e adolescentes de uma ONG de Campinas, que estavam lá, ouvindo as mesmas palavras que eu - porém se identificando em um nível que eu jamais poderei imaginar. Várias crianças e adolescentes sendo inspirados ali, na minha frente, ao meu lado, junto comigo.

Achei que esse era o texto perfeito para ser o meu primeiro do blog, visto que a ideia do mesmo veio de um "debate" entre eu e Rafaela. Debate esse sobre a sociedade, um dos milhares que já tivemos. Nossos debates questionam, problematizam, nossos debates incluem ideias, incluem mudanças. Esses debates criaram esse blog que, apesar de vir de uma ideia singela e básica - escrever aquilo que discutimos e um pouco mais - esperamos que atinja alguém: uma pessoa, duas ou, quem sabe, três.

Porque mudar o mundo é isso: é trabalho de formiguinha. É um tijolo de cada vez. Até que você perceba que já levantou um muro todo e, de repente, que já construiu todo um castelo.

Assim sendo, sigamos, juntas! :)


* Errata: O Eduardo referiu-se à citação como sendo do Mandela, mas, segundo o Google, a frase é, na realidade, da escritora Marianne Williamson.


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